Por Manuel Luciano da Silva, Médico
Muita gente sabe que o caldo verde é uma sopa de couve portuguesa, tipicamente do norte de Portugal Continental, mas muito divulgada por todo o país.
Couve é o nome genérico que se usa para descrever uma grande família de hortaliça caracterizada por folhas largas, esverdeadas e muito ricas em nervuras, fibra e vitaminas.
Existe uma variedade de couves: couve galega, couve lombarda, couve crespa, couve penca, couve tronchuda, couve bastarda, couve repolho, couve brócolo roxo, couve brócolo branco e até couve flor!
Mas a couve preferida para se fazer o caldo verde, como deve ser, é a couve chamada galega, muito cultivada na Província do Minho em Portugal.
Na Nova Inglaterra os nossos emigrantes cultivam a couve galega, depois de usar vários truques para passarem, contra a lei, na alfândega as sementes desta couve preferida.
Na América há uma couve semelhante à galega que tem o nome de: “collards”.
Devido às temperaturas negativas as couves galegas não se aguentam ao relento durante os meses de inverno e assim a nossa gente usa um tipo de couve crispada chamada “kale”.
Mas o caldo feito de “Kale” não é genuinamente caldo verde.
Perde a sua característica, não pelo tipo diferente de couve, mas sim pelos ingredientes que as cozinheiras imigrantes lhe adicionam e que não devem fazer parte da receita do caldo verde.
Sucede que a composição da “kale soup” é muito complexa: além da couve ou “kale”, leva carne de vaca, carne de porco, chouriço ou linguiça, feijão, batata, cenoura, água, sal e mais não sei quê.
Gostosa? Sim, senhor, mas é tão concentrada, é tão forte que até faz lembrar cimento armado ou entulho!…
Em contrapartida a receita do caldo verde é muito simples: água, sal, batata ralada, couves cortadas às tiras fininhas, azeite português e mais nada!
No entanto, há muitas donas de casa que não sabem cozinhar o caldo verde como deve ser.
Não fazem caldo verde para os seus familiares por que dá muita maçada a cortar as couves às tiras muito fininhas…
Mas talvez a razão principal seja por as cozinheiras portuguesas na América pensarem que o caldo verde por ter tantas couves não tem nenhum valor nutritivo, não presta para nada!
Como estais enganadas, minhas senhoras!
O Caldo Verde evita o cancro!
Se vos disser que de todos os cozinhados tipicamente portugueses o caldo verde é o melhor para a nossa saúde?!
Que pensais se vos disser, como médico, que o caldo verde evita o cancro?!
E se vos disser que o caldo verde evita os ataques do coração por reduzir no sangue o colesterol, pensais que é fantasia!?
E se vos disser mais: que o caldo verde evita as pedras na vesícula e evita as hemorróidas?!
É caso para perguntardes: se isso é verdade, porque é que levou tanto tempo a descobrir que o caldo verde é tão milagroso?!
Doutor Burkitt
Na década de setenta o famoso médico inglês Burkitt chefiou um grupo de médicos da Grã Bretanha que foram para a África Central estudar as diferenças entre as doenças que existem na selva e na zona metropolitana de Londres.
Depois de estudos muito apurados o Dr. Burkitt veio a descobrir que existe no continente africano um tipo de cancro diferente que é causado por um vírus.
Esta descoberta foi sensacional porque provou-se, pela primeira vez, que certos tipos de cancro podem ser causados por vírus.
Em honra desta descoberta o mundo médico mundial passou a chamar a este tipo de cancro: Linfoma não-Hodgkin de Burkitt.
Revelo esta informação médica a respeito do Dr. Burkitt para os leitores melhor apreciarem o calibre das observações que a equipa do Dr. Burkitt veio a registar no que diz respeito às diferenças que existem entre a dieta dos nativos africanos e a dieta do povo londrino.
Primeiro, os médicos ingleses verificaram que os nativos nunca tinham prisão de ventre, não contraíam cancro do recto, não tinham ataques do coração, não sofriam de hemorróidas, nem apendicite aguda!
Surpreendidos com estes factos os médicos britânicos constataram que os nativos africanos defecavam ou obravam, durante 24 horas, um volume, QUATRO VEZES maior do que qualquer cidadão inglês!
Admirados com este achado, os mesmos médicos prosseguindo com as suas pesquisas concluíram que a diferença dramática de saúde entre o povo inglês e os nativos em África se devia ao facto dos africanos comerem NOVENTA POR CENTO de ALIMENTOS RICOS em FIBRAS VEGETAIS, que não chegam a ser absorvidos no intestino delgado e saem nas fezes praticamente intactos, aumentando assim o volume fecal, evitando portanto a prisão de ventre!
Nos últimos anos mais de mil especialistas em todo o mundo têm publicado artigos em jornais e revistas médicas sobre as observações da equipa médica do Dr. Burkitt, CONFIRMANDO que os alimentos melhores para a nossa saúde são aqueles que têm mais fibras vegetais não-reabsorvíveis e que nos obrigam a visitar mais vezes a retrete….
Eu tive oportunidade de ouvir uma conferência sobre este assunto pelo Dr. Burkitt, há vários anos, no Hospital de Roger Williams, em Providence, Rhode Island, na qual o famoso médico usou esta frase bombástica:
“É MAIS IMPORTANTE SABERMOS O VOLUME DA MERDA DIÁRIA DUMA PESSOA DO QUE O VALOR DO SEU AÇÚCAR OU DO SEU COLESTEROL!”
BENEFÍCIOS DO CALDO VERDE
Para apreciarmos as maravilhosas qualidades do caldo verde temos que primeiro analisar o nosso aparelho digestivo.
Qual é o comprimento do nosso tubo digestivo?
Qual é a distância que vai da boca até ao ânus?
Resposta:
O comprimento do nosso tubo digestivo é quase SETE vezes a altura de cada pessoa!
Deste modo se um homem tem de altura um metro e meio, o seu tubo digestivo possui DEZ METROS de comprimento! É igual à mangueira de regar o quintal!…
Agora compreendemos melhor porque é que a Natureza exige que a nossa alimentação contenha 90 por cento de alimentos com fibras vegetais que não sejam reabsorvidas.
É preciso que a nossa alimentação contenha substâncias que não desapareçam, que não sejam reabsorvidas, no percurso do tubo digestivo, porque de contrário não chegará nada ao fim do canal que tem em média mais de dez metros de comprimento…
Conteúdo do Caldo Verde
Analisemos agora o conteúdo do caldo verde:
COUVES – As couves são a parte mais importante do caldo verde porque são muito ricas em fibras não-reabsorvíveis.
Além disso as couves são muito ricas em vitamina A e complexos B (tiamina, riboflavina e niacina). Possuem também cálcio, ferro, fósforo, potássio, mas têm poucas calorias.
AZEITE — O azeite deve ser português porque é muito rico em ácidos não-saturados que fazem baixar o colesterol mau.
BATATA — serve para amaciar, tornar mais homogéneo o sabor do caldo verde e o seu valor calórico não está fora de ordem.
UMA CEBOLA, DOIS DENTES DE ALHO E ÁGUA QUENTE — A água quente do caldo verde é muito importante, porque faz funcionar muito melhor os sucos digestivos e os fermentos ou enzimas do aparelho digestivo.
A água quente faz descontrair os esfíncteres ou válvulas do aparelho digestivo, estimula a contracção normal da vesícula biliar e relaxa o estômago e os intestinos delgado e grosso, tornando a nossa digestão agradável e saudável.
SAL— Não deve ser exagerado. Só o preciso!
CHOURIÇO — O chouriço – para ser cortado às rodelas e pôr no caldo verde — deve ser cozido à parte para se deitar fora a água porque esta contem os produtos cancerígenos do chouriço devido ao processo de ter sido defumado.
BROA — A broa deve ser à moda portuguesa feita com o farelo e farinha de milho como se coze na nossa terra.
Quem comer uma malga de caldo verde todos os dias não tem prisão de ventre!
Quem não tem prisão de ventre não tem hemorróidas!
Por outro lado uma pessoa fazendo as suas necessidades diariamente, o fígado é obrigado a produzir mais bílis e a vesícula a expelir mais sais biliares para untar a tripa por dentro para que os alimentos deslizem melhor.
Deste modo saindo mais bílis (rica em colesterol) para o exterior através das fezes, dá-se uma baixa de colesterol no sangue, diminuindo os riscos de ataques cardíacos e de pedras da vesícula (compostas por colesterol)!
O caldo verde faz também com que a pessoa emagreça e se torne mais saudável e mais feliz.
CANCRO DO CÓLON
Tem-se verificado uma relação directa entre a prisão de ventre e o cancro do cólon ou do intestino grosso. Porquê?
Porque quando há prisão de ventre as fezes ficam paradas no intestino grosso, ou cólon e assim os produtos tóxicos contidos nas FEZES RETIDAS bombardeiam as células da mucosa intestinal de tal maneira que com a REPETIÇÃO deste processo desencadeia-se o princípio do cancro do cólon ou do intestino grosso que é uma doença terrível!
Como contra prova dos estudos que a equipa do Dr. Burkitt observou em África, deram-se aos nativos africanos dietas iguais à que os ingleses e americanos usam com McDonalds, “ice cream” ou sorvetes, pizzas, lasanhas, batatas fritas, etc.
Inverteu-se a dieta: em vez de 90 % de dieta com vegetais os nativos africanos passaram a ter uma dieta de SÓ DEZ por cento de vegetais.
Resultados:
Os nativos começaram a engordar, o colesterol começou a subir, passaram a ter prisão de ventre e a desenvolver hemorróidas como os ingleses e os americanos!
Parece incrível, mas é verdade! No fim do século XX são os povos primitivos a ensinar ao homem civilizado, ao homem dos produtos sintéticos e das pastilhas qual é a alimentação mais saudável!
Termas de Melgaço
Há mais de 40 anos visitei as Termas de Melgaço no Norte de Portugal.
Estas termas são especialmente dedicadas a doentes diabéticos, cardíacos e renais.
Observei então que fazia parte do tratamento obrigatório, a todas as refeições diárias, um grande prato de caldo verde.
E todo o doente que quisesse comer fora das três refeições só podia comer mais outro prato de caldo verde!
O certo é que todos os doentes melhoravam das suas enfermidades!
Ainda hoje em Coimbra quando os estudantes fazem uma farra ou há uma reunião de curso e se come e se bebe exageradamente… depois duma bela guitarrada, à meia noite, serve-se sempre um caldo verde – bem quente – para “limpar e acalmar as entranhas”…
Quando tiver uma festa grande em sua casa faça o mesmo: ofereça aos seus convidados um caldo verde para despedida e para terem boa viagem!…
RECEITA DO CALDO VERDE À MODA DE VALENÇA DO MINHO
Dois litros de água;
4 colheres de sopa de azeite português;
750 gramas de batatas;
1 ou 2 couves galegas conforme o tamanho;
sal;
1 chouriço (cozido à parte);
broa.
TÉCNICA:
Deita-se a água numa panela com o azeite e batatas descascadas cortadas em 4 pedaços.
Põe-se sal quanto baste e deixa-se ferver.
Quando as batatas estiverem cozidas, tiram-se e passam-se por um passador.
Voltam à panela para apurar.
Entretanto cortam-se as couves em tiras o mais fino possível.
Lavam-se e deitam-se na panela 15 minutos antes da sopa ser servida, deixando a panela ferver DESTAPADA.
Serve-se em tigelas de barro, com uma rodela de chouriço e um bocadinho de broa.
Como já se encontram à venda na Nova Inglaterra as deliciosas sardinhas portuguesas congeladas, pode ser que algum dia algum comerciante se lembre de fazer coisa semelhante e nos mande as couves galegas já cortadas às tirinhas em caixinhas congeladas, prontas a meter na panela, para saborearmos, mesmo durante o Inverno, o nosso genuíno caldo verde!