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O Guarda-Soleiro e o Vendedor de Sementes

O Guarda-Soleiro

Tareri!… Tirerá!…

Era o guarda-soleiro
Que se fazia anunciar
À porta gente vinha
Quando algo tinha
Para ele consertar.

Louça partida se aproveitava,
Era só os cacos unir,
Com arames remendar
Até voltar a partir.

Guarda-chuvas feitos num oito
Era o que mais havia,
Com linhas e arames
O guarda-soleiro” cosia.

Outras coisas eram feitas
Na pedra de amolar
Tesouras e facas afiava
Com a pedra a girar
.

Quando algo partia,
Era só esperar
Mais dia, menos dia
Voltaria a passar.

Manuel Amorim


Albino Filipe Pereira nasceu a 17 de Abril de 1884 e morreu a 17 de Dezembro de 1970. Viveu no lugar da Póvoa, na freguesia de Junqueira.

Vendia sementes, garantidas das melhores procedências, pelas povoações, nas feiras e festas. Era um poeta popular e escreveu em verso a sua vida:

De 10 anos fiquei órfão
Deus levou meu pai e mãe
O autor criado vosso
Qualquer dia vai também.
Nunca esqueci um Pai-Nosso
Pelos que Deus me lá tem.

Meus pais eram lavadores,
Em menino me deixaram.
Passei vida de horrores
Com rigoroso trabalho
Os filhos são as flores
Que os pais regam com orvalho.

Os regadores são os olhos,
A água cai-lhes do rosto,
Há homens que o ignoram,
Que desconhecem tal gosto:
Um filho sem pai e mãe
É planta sem encosto.

O amor de pai e mãe
Poucos sabem avaliar.
Os meus ficaram também
Sem mãe de tenra idade,
E a mais nova de oito meses
Que Deus também quis levar.

Há muitos filhos e filhas
Que desestimam seus pais
De maiores só querem partilhas
Pra não se importarem mais.
Se é a senda que trilhas
– Cedo ou tarde a pagais.

Para meus filhos criar
E cumprir os deveres de homem
Não me tornei a casar
Para eles não passarem fome.
Se me dispunha a gozar,
Eu criava outro nome.

Enviuvei, não casei mais
Por causa da filharada.
Se vinha uma das tais
Tinha que usar ramada
Davam-se casos fatais
Havia muita pancada!…

Conheci homem que casou
Até à terceira vez.
E Deus todas lhe levou,
Arranjou outra e bem fez:
Neste mundo se fartou
De tosquiar tanta rês…

Não sei se faria asneira
Em não tornar a casar
Se ela fosse criadeira
Povoava um lugar…
No meio de tal bicheira
Nem os podia estremar…

O homem que casa três vezes
Às mulheres é que não poupa
Na feira era bom freguês
Que comprava muita roupa,
Se eu fazia como ele fez
Era um “cabeça louca”…